Não interessa aos libertários saber quantos são, pois nas suas hostes não se recrutam agentes do poder e muito menos se atribuem números aos militantes. (carlos fonseca)

"Sou um bug ou dois na minha vida". (lena berardo)

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

1º Trabalho elaborado para Feminismo e Linguística - A Linguística em Mim



Desde que tenho lembranças que me lembro das expressões de meu pai: “Deves” e “Podes mas…”.
Nasci e fui criada numa família de artistas. Uma família “remediada” em termos financeiros, com alguns momentos melhores e outros piores. Uma família onde as palavras mais utilizadas eram comida e liberdade.
Boa aluna. Tinha que ser
Não pretendiam de mim mais nada a não ser isso. Ser boa aluna.
A expressão “ter que ser” foi sempre auxiliada pela “porque tu és capaz”.
Capaz e muitas vezes capataz de mim própria.
Cresci normalmente. Não tão normalmente como a maioria dos meus colegas, visto estar sempre rodeada de livros, mas um normalmente juvenil, com amigos, o gosto pela música, pelas festas, pelos concertos… Muito irreverente mas, e principalmente, com o gosto pela leitura e pela banda desenhada e o tal “podes mas…”. O interiorizar das consequências dos actos.
Cresci com o ter que saber escolher com um tão, e sempre, vasto leque de escolhas. Fosse no que fosse. Tipo de leituras, estudo da natureza, dos animais, da ciência e tecnologia, cinema, música pop e clássica, cultura, arte… Tudo estava ao meu alcance. Tudo me foi mostrado. E a escolha não era nada fácil.
As palavras de meu pai ecoavam constantemente na minha cabeça. Cresci e sou os ensinamentos de meu pai. As suas exigências na minha perfeição, o seu gosto pela natureza e pela ciência, pelas letras, pelos números, pelo raciocínio lógico.
Horas e horas a ouvir as palavras de meu pai e o coração de minha mãe.

Ouvia o coração dela sim. Por vezes mais amargurado pelas dificuldades da vida. O curso de analista que não acabou porque eu nasci… Ouvia-a a falar pela máquina de costura que matraqueava durante as tardes para me fazer mais um vestido quando eu queria calças.
O ter que ser a melhor passou a ser o sonho de outros. O sonho de meu pai, o desejo constantemente transmitido de eu “ter que ser alguém”.
A juventude prega muitas partidas e eu, na inconstância dos dias de não saber muito bem quem era, o que queria, de ter o mundo aberto à minha frente com tantas leituras já feitas apesar da idade, de gostar de letras e números, sem saber para que lado me devia virar, escolhi o que me daria menos trabalho e ao mesmo tempo me permitisse continuar a ler o que gostava e não por obrigação.
Números, - pensei, as letras escolha-as eu.
E tirei um curso de engenharia.
Muito mais palavras passaram por mim desde então.
Casei. Tive filhos. Divorciei-me. Em todos estes actos a palavra foi fundamental. Principalmente a forma como me foi dita e como eu a disse.
Letras? Continuei a lê-las. As letras ensinaram-me a pensar. As palavras escritas acompanhar-me-ão para sempre.
Por isso, hoje estou aqui!

6 comentários:

Anônimo disse...

Letras, palavras, gestos, desenhos, pinturas, esculturas... Escolhemos nós as que dizemos ou fazemos. Pena, por vezes, não escolhermos as que nos dizem. Evitávamos um monte de ruídos. Mas esta linguistica em ti mais que letras ou palavras, é uma pintura. Continua a pintar amiga!

joaninha versus escaravelho disse...

Muito obrigada por estas palavras.
Esqueceste-te de assinar? :P
Assim não sei quem é a amiga/o (primeiro o feminino e depois o masculino, já que estou em Estudos Feministas) a quem tenho que agradecer pessoalmente. :D

olinda silva disse...

Bom trabalho o do teu pai, parabéns para ele!
Beijos para ti.
Bom fim-de-semana! ;-)

joaninha versus escaravelho disse...

:)
Agradeço pelo meu pai e por mim. :)
Beijitos e bom fim de semana!

Anônimo disse...

As palavras levam-nos a sitios que a memoria guarda. Lembrei me a proposito do teu texto do poema "gracias a la vida" cantado pela Mercedes de Sousa. Uma parte diz +- assim:
"Gracias a la vida/ que me ai dado tanto/ me ai dado el sonido e el abecedário..."
Bonito não achas?
Carlos (desanonimei-me)

joaninha versus escaravelho disse...

Tenho uma amiga que canta isso tão bem... :)
Essa música trás-me a mim memórias muito boas. Por exemplo lembrar-me dessa amiga de há 25 anos e que ainda hoje mantenho: a Iolanda.
É muito bonita essa letra, sim e as tuas palavras também.
Já agora esse verbo "desanonimar" é moçambicano?
:P
Adorei-o!