Não interessa aos libertários saber quantos são, pois nas suas hostes não se recrutam agentes do poder e muito menos se atribuem números aos militantes. (carlos fonseca)

"Sou um bug ou dois na minha vida". (lena berardo)

segunda-feira, 30 de maio de 2011

Marias pelo mundo a propósito dos CNO

No primeiro ano do mestrado que frequento fiz um trabalho sobre uma amiga. Trata-se de uma senhora (Maria)da minha idade que decidiu frequentar aulas nocturnas para poder "ter o 9º ano", como ela me dizia, através de um RVCC (Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências).
Maria,apesar de ser da minha idade, teve um percurso muito diferente do meu.
Andou na escola (aos 6 anos teve contacto com o 1º livro da sua vida, curta até à altura) até aos 10 anos. Queria "ir para o ciclo - que na localidade onde habitava não existia, havendo apenas tele-escola, mas a mãe tinha ideias contrárias. Mesmo assim, e com 10 anos, resolveu matricular-se sem ninguém saber. Quando chegou o início do ano escolar teve que contar à mãe. Maria era filha única e não tinha pai. A mãe, a madrinha e os avós maternos, pessoas com quem vivia, decidiram dar-lhe uma oportunidade.
E ela lá foi.
Ficou pelo 6º ano. A partir dái o liceu já era muito longe para poder ir a pé e o dinheiro não abundava lá em casa. Deixou de estudar e foi "servir" para casa de uma senhora, que segundo ela "lhe ensinou tudo o que sabe hoje". Refere-se a cozinhar, costurar, bordar, fazer renda, passar a ferro... vida de mulher...
Maria conta-me a sua história sem mágoa, sem dor e orgulhosa do seu percurso. Estava finalmente a conseguir o tão almejado 9º ano (diz que com esta idade já não vai tentar o 12º...).
Maria todos os dias me mostrava os trabalhos que desenvolvia em casa e começava no curso. Muitas das vezes me foi pedir ajuda. Introduzia-lhe uma imagem, uma fotografia. Maria escrevia a história da sua vida. O nascimento, a escola, o trabalho, o namoro, a catequese que dava, o casamento, os filhos que são o seu orgulho porque frequentam os dois a universidade...
Maria é feliz.
E eu fiquei mais feliz por ter uma Maria que confiou em mim, que me pediu ajuda e me fez sentir útil.
Maria ainda me serviu de tema e estudo, juntamente com o seu trabalho, num trabalho de seminário nesse ano.
Aos 10 anos (e aos 15...)eu ainda brincava com bonecas e nunca me passaria pela cabeça não ir à escola porque tinha que trabalhar, muito menos em me ir matricular às escondidas...
Maria é uma grande mulher!

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